Wednesday 24 December 2008

Espírito meu, Natal.


Natal. Tem anos que eu não sei mais o que é isso. Tem anos que eu vago de lar em lar, de país em país, e é sempre a mesma decepção...

Será mesmo que para sempre o sentido foi perdido será que para eternidade não haverá mais um único ser pequenino entre os homens e as mulheres que possa de novo fazer a beleza dos sinos surgir e a luminosidade dos pisca-piscas entreterem as crianças uma vez mais?

Pois te digo leitor, te afirmo com o resto de sopro de vida que meu bom criador me dedicou: Há! Por isso que estou deveras radiante nessa noite fria, por isso que estou aqui te contando tal fato surpreendente, pois também este me cativou...

“Quando menos eu supusera, quanto mais eu acreditava que a neve fazia a falta que sempre fez para me revelar o calor do coração humano, veio até mim aquele pequenino ser de luz, com seus olhinhos brilhantes e sua alva pele em contraste com os revoltos cabelos angelicais. Eu nunca o vira pelas ruas escuras do subúrbio em que sempre morei, nem me lembro se o vira, mas não sei ao certo, algo em mim afirmava que eu o conhecia profundamente, e não me atrevi a negar quando me estendeu os brancos pequenos e delicados para me abraçar, não. Eu não resisti em segurá-lo em minhas mãos e elevá-lo à altura de meu rosto, olhei-o nos olhos e o sorriso brotou sem qualquer aviso.

Ele, em sua simplicidade infantil, apenas deitou-se em meu ombro. E foi então que me sussurrou aquelas palavras inesperadas:

-‘Me leva até a minha mamãe’

Mas como podia? Como havia de ser? Uma criança tão pequena perdida daquela que havia de protegê-la em todos os dias de vida e de morte. Ah! Só o meu Senhor lá de cima poderia contar-me como aquilo havia de ter acontecido. O mais inacreditável foi a minha certeza de para onde ir, a certeza dos meus pais de caminharem sem nenhum temor pelas ruas. Era algo alem de qualquer explicação. Aquela pequena possui em si algo de motivador, algo que transcendia qualquer dever que me obriga-se a escolher outro caminho. Esqueci até dos meus supostos compromissos. Aquele era o maior de todos, era como a realização daquilo que esperei por toda a minha vida.

Andei. De vagar, sem pressa. Andei. Em um sorrir eterno e que jorrava a luminescência que estava em meu semblante.

Não temi a nada, não temi a ninguém. Apenas sentia o corpinho mirrado grudado em meu corpo, cedendo-me aquele calor pelo qual ansiava, cedendo àquelas certezas de sonhador que jamais deveria um homem abandonar.

Passou um tempo sem tempo. Passaram-se muitos desses. E as minhas preocupações tão mundanas, bem, eu não as mais reconhecia como importantes. Eu só sabia de uma coisa, eu só tinha certeza de uma coisa: aquela noite fora feita para mim, ela e a chuva que a coloria em regar. Era a minha vez de cantar na chuva, era a minha vez de sorrir para dar vivacidade ao farrapo humano que eu me tornara. Não fora simplesmente a chegada daquela criança, não fora simplesmente ela, mas fora eu mesma, fora por impulso daquele ser puro e inocente que eu ganhara novamente a coragem de não sair desistindo de todos que encontrava. E tudo isso ia rodopiando nas pontas dos meus pensares enquanto eu abraçava a menininha dos meus olhos com o afeto que eu jamais imaginara ser capaz de apresentar e expor.

Mas quanto mais andava, mais tinha certeza de não poder encontrar a mãe dela. Mais sabia que iria falhar. E mais queria poder não falhar. E quanto mais a criança sussurrava:

-‘Onde está a mamãe?’

Porém, não me afligia isso, não me tornava angustiada por não conseguir, eu tinha certeza que fazia o meu máximo e ela também. Ela confiava em mim, desde o primeiro instante. Amada. Sim, ela era isso. Ela ainda é isso.

E no meio dos meus jorrares ternos, o calor dela só me confortava mais e mais. Não havia mais o eu, não havia mais o ela.

Foi então, que me dei conta. Assim, como que do nada e como que do tudo. Ela não estava mais lá nos meus braços, ela não estava mais ali a me abraçar. Sentei-me no primeiro banco que encontrei, e tenho certeza, era apenas eu naquele banco. Uma voz fraca dirigiu-se a mim, mas não me assustei. Não era uma voz desconhecida, não isso não era. Voltei-me e dei de cara com aquela senhora que parecia ter muitos anos terrenos, mas em seus olhos tão azuis dizia-me ser só uma criança. Sim, ela possuía a pureza das esferas estrelares e o brilhar dos cometas. Desculpei-me, pedi que repetisse o que me dissera, e ela disse, olhando-me com os olhos que sorriam – sim ela era possuidora de três sorrisos: aquele dos lábios, aqueles outros de cada olho - , ela repetiu com total segurança:

-‘Finalmente, não sentira falta desse nosso silêncio cúmplice minha pequenina?’

Foi então que notei, ela não falava com a voz que surge de nossa garganta, a voz vinha de toda ela, e eu a escutava, fui responder... Mas, que maravilhosa surpresa, minha boca não se movia também, era como uma sintonia.

Não respondi a pergunta, apenas perguntei:

-‘Onde está a pequenina que abraçava?’

E ela sorriu com mais fervor que antes. Eu não entendi, nem de longe iria entender, eu não queria entender. Queria apenas sentir. Foi quando a vi fazer aquele gesto, aquele tão singelo. E senti que o repetia. Senti que escutava uma segunda voz:

-‘Eu voltei para você.’

Não precisei de mais nada para entender. Entender que finalmente a recuperá-la. Sim, ela voltara para mim quando eu já havia a muito dado-a como perdi em eternidade. Virei-me para perguntar como ela sabia daquilo, como podia saber. E a velha senhora dos lindos olhos já se fora, em seu lugar estava uma jovem, pouco mais que uns dezessete, mas eram os mesmo olhos, era a mesma. E me disse em seu mais sincero sorriso:

-‘Voltamos. Você minha criança e eu. Mãe e filha. Filha e mãe. Ao nosso conhecer de uma pela outra. Das conversas dos mais discretos olhares. Das conversas de só estar perto. Enfim, a minha pequenina voltou para si mesma. E as durezas de sua própria razão voltaram a submissão de seus sentires. Você voltou quando já não sentia mais esperança.’

E com uma lágrima nos olhos. Com o último olhar. Abracei- a. Eu sabia, era o nosso Adeus. Era a despedida, e era a reconquista dos anos que perdi por manter-me afastada. E lá estava eu, no mesmo banco, com a lágrima dançando pela minha face. Aparentemente desacompanhada. Mas em eternidade repleta da criança. Da minha criança, e da minha mãe me restara cada memória em verdade do que ela já o fizera para mim e que eu achara ter esquecido. Para alem de sempre, eu era a ganhadora dos abraços dela e dos ‘eu te amo’ mais belos que poderiam me ser dados.”


E hoje, nesse meu agora infinito, eu entendo: Como poderia querer encontrar aquilo que faltava em mim nos outros ao meu redor?



No fim, todos a sua maneira, retém e sempre

reteram essa mágica de encanto. E agora, a todos,

o mais maravilhoso Natal que poderia abater sobre

vossas cabeças e vossos corações. Ele, eu, ela, nós –

e nossos brilhos de Amor.

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